segunda-feira, 2 de março de 2009

Morre Walter Silva, o Picapau


Waltecir Paulo da Silva, o Walter Silva, ou como era mais conhecido, o Picapau, morreu nesta sexta-feira, 27, no Instituto do Coração do Hospital das Clínicas. A poucos dias de completar 76 anos de idade, cardiopata e portador de insuficiência cardíaca e renal, o jornalista, radialista, produtor musical e um dos grandes fomentadores da bossa nova não suportou um “choque séptico em função de abcesso pulmonar”, segundo publicou neste sábado o jornal Folha de S. Paulo. 

Apaixonado por música brasileira, Picapau começou sua carreira profissional em 1952, aos 19 anos, na Rádio Piratininga. Passou pela Cultura (1954) já como locutor e apresentador, pelas cariocas Mayrink Veiga, Mundial (1955) e Nacional (1956) e, em 1957, assumiu a cadeira de Diretor de Divulgação da novata gravadora RGE (SP), ao mesmo tempo em que lançou seu programa Toca do disco na Rádio Record. No entanto, o programa que o eternizou foi lançado na Bandeirantes em 1958. Era O pick-up do Picapau. Por esta mesma rádio, representou o Brasil como repórter no histórico e polêmico Festival de bossa nova, realizado no Carnegie Hall, em Nova York em 1962. 

Após este ano, quando a bossa nova já não desfrutava do mesmo frescor no Rio de Janeiro, São Paulo se consolidou palco e mercado de intérpretes e instrumentistas do estilo moldado por João Gilberto e companhia. Picapau teve neste momento papel decisivo ao produzir e gravar shows no Teatro Paramount que fotografaram tanto a bossa nova quanto o nascimento do que se convencionou chamar de MPB. Alguns destes espetáculos entraram para a história, como Samba novo, Mens sana in corpore samba, Primeira dentisamba e O remédio é bossa, que revelou Elis Regina. Foram shows com gente do calibre de Chico Buarque, Yvette, Alaíde Costa, Walter Santos, Zimbo Trio, Wanda Sá, Cesar Roldão Vieira e Titulares do Ritmos. De todos, o mais frutífero (artístico e comercialmente) foi O fino da bossa, realizado nas noites de 9, 10 e 11 de abril de 1965, com Elis e Jair Rodrigues soltando os vozeirões em bossas e sambões com acompanhamento jazzístico do Jongo Trio. Os shows viraram o LP Dois na bossa, recordista de vendas naqueles anos. 

O pioneirismo de Picapau também marcou a gravadora Continental, que dirigiu em 1970. Lançou Célia, Pessoal do Ceará, Walter Franco e Secos & Molhados. 

Como desse para resumir num parágrafo, nos anos seguintes Picapau moldou o programa Mixturação (1973), com Walter Franco, Pessoal do Ceará, Simone e Haréton Salvanini; dirigiu o Fantástico (1975), da Rede Globo; foi narrador de futebol, passou pela TV Bandeirantes em 1980 e tocou o programa Mambembe, que revelou Thomas Roth. Também colaborou com jornais impressos e editou em 2002 o livro Vou te contar – Histórias de música popular brasileira. Nos últimos três anos, colocou sua voz e patrimônio no semanal Acervo Walter Silva, levado ao ar pela Rádio Cultura AM. 

Aliás, seu precioso acervo de gravações de shows, entrevistas e canções em 162 rolos de fitas e fotos foi adquirido pelo Instituto Moreira Salles em 2003. Segundo o site da entidade, o material ainda não está disponível para pesquisa. 

Uma das jóias que guardou por muitos anos – e que tentou lançar em disco - foi o histórico show de dois de agosto de 1962 na boate carioca Au Bon Gourmet, que reuniu no mesmo palco Tom Jobim, Vinicius de Moraes, João Gilberto e o grupo Os Cariocas, além do baixista Otávio Bailey Jr. e do baterista Milton Banana. Foi nesta noite que as músicas “Garota de Ipanema”, “Samba do avião”, “Samba da benção”, “O astronauta” e “Só danço samba” foram apresentadas pela primeira vez. Não é pouca coisa... 

Para sacar o astral deste registro e, consequentemente, a importância de Walter Silva, ouça o primeiro podcast que Dafne Sampaio, com produção de Daniel Almeida, ambos do Gafieiras, fizeram para a revista Monet, em 2008.

Gafieiras - Por Ricardo Tacioli

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